sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

Religião, justiça e humildade

(Leia: Lucas 18.9-14).

As Escrituras e as tradições religiosas que nelas se baseiam, dizem pra gente que nesta vida temos que ser justos e criar relações baseadas na justiça (de Deus e dos homens). Só que nossa justiça não é como a justiça de Deus, definitivamente. A nossa é balizada no feito ou não feito, mérito ou demérito. Ao passo que Deus, que é Justiça, age com base na graça e no amor. A Bíblia diz que não há um justo sequer que faça o bem e não peque. A tentação dessa nossa justiça capenga está em estabelecer ações morais calcadas num certo “bem”, e assim galgar o mérito, a salvação, a perfeição fisiologista – que não depende do estado interior, mas do cumprimento de determinadas regras e padrões no exterior.

O pecado, assim, torna-se uma categoria insignificante que só toma de surpresa os insignificantes, os impuros e os imorais, que descumprem as leis e mandamentos de Deus pelo simples fato de serem como são, vide o exemplo do publicano da parábola. Religião e vida se dissociam, assim como santidade e natureza humana. Por causa disso, como vaticinou J. Urteaga, “a terra está cheia de cristãos e, no entanto, o poder está nas mãos dos mortos”.

Não somos justos, mas fomos feitos justos por causa do sacrifício do único justo que habitou na terra. Nele, foi aniquilado tanto o jugo da ausência de justiça inerente ao existir na carne, como também o mérito humano. Assim, a santidade humana é produto da justiça de Deus e do humilde reconhecimento de nossos defeitos e limitações. Pra ser justo e santo, antes, é preciso ser plenamente humano. E ser humano é aceitar de corpo e alma as implicações que esse termo carrega; é assumir-se honestamente, é não tentar mascarar as imperfeições mais ou menos óbvias, seja por meio da resignação, seja através do exercício de uma “piedade pervertida”, parafraseando Ricardo Quadros Gouvêa, falsa e infrutífera.

O reino de Deus, como advertiu Jesus, não é feito de adultos cínicos e dissimulados, que só cresceram no tamanho e na sem-vergonhice, mas de crianças simplíces, honestas, verdadeiras, que possuem uma fé que ultrapassa meros feitos e sacrifícios, e que estendem braços livres, porém cônscios de sua dependência, em direção a Deus. De serezinhos que desenvolveram um coração humilde e aberto às novidades de Deus e a confiar plenamente em suas palavras, recebendo sem reservas o seu terno amor. Esses descerão justificados para suas casas, “porque qualquer que a si mesmo se exalta será humilhado, e qualquer que a si mesmo se humilha será exaltado” (Lc 19.14).

Jonathan

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

A Dança do Espírito

O vento sopra onde quer, ouves a sua voz, mas não sabes donde vem; assim é todo o que é nascido do Espírito” (João 3.8).

O sopro do Espírito é um sopro constante, mas nunca visível a olhos nus. Para se saber onde e como ele está soprando é preciso ter a capacidade de enxergar além. Além das aparências, das estruturas, das inibições de ânimo, das manifestações exóticas, de meras palavras. O Espírito pode estar em tudo isso, mas também pode permanecer “fora”. Ele não se limita ou se reduz às paredes do escravismo institucional humano, seja ele secular ou religioso. O Espírito é livre e age em liberdade: “onde está o Espírito do Senhor, ali há liberdade”.

Mas, convém perguntar, onde está o Espírito? Ele não se encontra exclusivamente aqui ou ali. Não se faz monopólio de uma instituição, pessoa ou evento. O eventualismo humano apenas inibe a verdadeira ação do Espírito, ao pretender dizer: “Aqui está ele”; “Neste encontro ele se manifestará com poder”. Definitivamente, Paulo estava certo ao afirmar que o homem natural não aceita nem compreende as coisas do Espírito de Deus, porque lhe são loucura, porque elas se discernem espiritualmente (1Co 2.14). Estamos falando do Espírito de Deus. Se Deus é o Onipresente, conforme diz o salmista, como se pode querer enjaular o Espírito?
Sua natureza é livre como é a de um animal selvagem, que ao ser preso ou confinado, perde todo seu vigor, vitalidade e espontaneidade anteriores. O Espírito Santo age movido pelo sopro, pela palavra, pelo toque de Deus. Ele está presente onde Deus se encontra fazendo suas pequenas e maravilhosas revoluções, nos lugares, das formas e com as pessoas menos esperadas. Não tem como antecipar sua presença ou ação. O poder de consolo do Consolador não repousa nem cresce na prepotência, nas palavras decoradas, nem na manipulação pensada; esse poder só é fecundo na fraqueza, em palavras e em seres imersos nas imperfeições de sua humanidade. Ele é o brilho do tesouro que habita em vasos de barro.

A dança do Espírito não aprisiona, mas promove as sábias loucuras revolucionárias e libertadoras de Deus. Todos os que tentam aprisionar Deus, confiná-lo ou formatar sua natureza em uma caixa, falam de um conceito, privando os outros e a si mesmo nele. Contudo, graças a Deus, a verdade não germina ali. O vento sopra onde quer, onde Deus quiser. Quem tem ouvidos para ouvir, ouça!

Jonathan

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Quero ser pobre de espírito

Quando tento imaginar a razão pela qual Deus resolveu chamar pessoas como eu para fazer parte do grande banquete do reino, não me vem à mente outra palavra mais contundente senão o termo graça. A graça é como um grande nocaute que impede meu senso de autopiedade de ultrapassar o primeiro round. Ela me transforma no menor de todos os seres humanos (em essência, é o que sou), ao mesmo tempo em que me eleva ao mais sublime posto: o de participar dos atos de Deus nesse mundo e de sua glória.

Olhe ao seu redor por um instante e observe a operosidade de mentes argutas, emoções polvorosas, vozes inquietas, mãos e pés ligeiros em busca de ascensão, realização, gratificação, recompensa e lucro maior possível. Parece que tudo o que nos diz respeito está na contramão da graça. E qual deve ser a resposta de cristãos autênticos a esse modo de vivência que nos cega e emudece em relação à manifestação de Deus? A resposta mais honesta e humanizadora para mim é: “Eu quero ser pobre de espírito”.

Chega! Basta de viver a ilusão de que existe algo nessa vida que me preenche e completa mais que a graça. Cansei de lastimar por meus fracassos mais óbvios, de me autoflagelar por causa de minhas limitadas habilidades e de sofrer com o golpe diário da reprovação. Deus já me aprovou para sempre quando, em Cristo, disse: “Está consumado!”. Recuso-me a buscar essa felicidade torpe e egoísta que comanda as consciências da maioria, estou farto dessa vida barata. Eu quero ser feliz ao modo de Jesus. Declino meu voto nesses plenários evangélicos que aprovam uma espiritualidade performática e de barganhas com Deus, e que recusa teimosamente o desafio do crescimento e da maturidade na fé.

Não consigo e nem preciso me adequar aos caminhos infrutíferos para o reino dessa visão legalista de santidade que por aí se tem pregado. Não! Não é preciso ser menos humano para ser santo na presença de Deus, nem é necessário negar aquilo que de natural e bom ele criou para ser puro. Quero, sim, aprender o que é o amor incondicional do Pai, a adentrar no mundo das pessoas, mesmo quando não me identifico muito bem com esse mundo, às vezes tão diferente do meu. Preciso me afastar da roda dos “santos” escarnecedores e juízes, e me juntar à dos estigmatizados e pecadores. Não quero mais fingir ser mais do que realmente sou: um pecador salvo pela graça! Quero servir somente a ti, Deus dos des-graçados.

Jonathan

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Cremos na liberdade?

Quanto mais o tempo passa, menos nos damos conta da quantidade de sonhos, projetos, ideais, visões, pensamentos e oportunidades que deixamos para trás, como quem joga um sapato velho fora, quem sabe por puro medo de assumir riscos, responsabilidades, por medo de errar, de frustra-se, de perder. Nem sempre adquirimos determinados hábitos por livre e consciente escolha, mas por receio de criar ou mero comodismo. O hábito de reprimir tudo aquilo que pode gerar desconforto, dor, sofrimento; o hábito da não reflexão, do não pensar ou medir conseqüências; o hábito de se conformar com o remediável diante da preguiça e a supressão da criatividade; o hábito de buscar a felicidade a qualquer preço, sem o custo do envolvimento, mas por puro individualismo.

Liberdade, nesse ínterim, deixou de ser vocação, processo, conquista, ousadia, utopia e inventividade, passando a se resumir à tirania dos desejos, propiciação autocentrada, curtição efêmera, falta de compromisso, de engajamento, de ideais ou de santa inquietação com o hoje com as vicissitudes do amanhã. A vida cristã perde sua centelha revolucionária quando deixamos de acreditar e lutar pela liberdade, uma liberdade que não tenha nada a ver com a mera satisfação imediatista de vontades, porém com a esperança de ser livre na relação com outros seres livres ou em busca dessa liberdade.

Ser livre é ser grato, é viver intensamente as possibilidades do presente, é arriscar ser diferente, é dar um salto além do lugar em que se está, é não ter receio de amar apenas por repúdio ao sofrimento, é assumir-se como se é, aceitando todas as implicações da vida que se tem, bebendo de seu próprio cálice, compartilhando com o outro tanto das benesses com das mazelas da existência. Ser livre é poder ter alegria sem a necessidade de abolir tristeza, a beleza de um sorriso que se mistura com lágrimas, de uma vida que está sujeita não somente à claridade como também à tempestade, não apenas à festa como ao pranto.

Na liberdade da fé corremos riscos o tempo todo, é inevitável. A fé, na visão de José Comblin, consiste em que a pessoa se entregue à sua vocação para a liberdade. "A fé é risco porque ninguém tem a experiência daquilo que vem depois. A liberdade é o risco total. A fé é jogar-se no risco. Pascal dizia que era uma aposta. Porém trata-se de uma aposta radical, aposta pela vida contra a morte, aposta pelo caminho da vida, sem tê-la previamente experimentado". (Vocação para a liberdade, p. 47).

Jonathan

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

As plenitudes incompletas da vida

Uma das mais árduas tarefas da vida é a de percorrer a “via do meio” – o caminho do equilíbrio, da moderação. Há justo que perece na sua justiça tanto quanto há injusto que perece em sua injustiça. “Nem tanto o mar nem tanto a terra”, afirma o dito popular. “Bom é que retenhas isto e também daquilo não retires a mão”, complementa o Pregador. Todas essas frases corroboram para o fato de que o mal reside no excesso. Seja em sabedoria ou loucura, tristeza ou alegria, ira ou mansidão, pobreza ou riqueza, chuva ou sol; nenhuma serve à vida quando tomada em “doses cavalares”. Mas por que persistimos tanto em nos agarrar a umas das pontas da lança?
Enquanto lia “Do sentimento trágico da vida” (1913), do poeta espanhol Miguel de Unamuno, deparei-me com a seguinte frase: “a razão repete: vaidade de vaidades, tudo é vaidade! A imaginação replica: plenitude das plenitudes: é tudo plenitude! E assim vivemos a vaidade da plenitude, ou a plenitude da vaidade”. Parece que estamos sempre almejando “ser plenos” de alguma coisa. Plenos de alegria, esperança, gozo, fé; plenos de sucesso, amor, felicidade; ou até plenos de racionalidade, desrazão, obscuridade ou tragédia. Contudo, Unamuno toca num ponto nevrálgico: nem a plenitude ou imaginação, nem a razão, que tragicamente afirma tudo não passa de vaidade, preenchem realmente. Trata-se de falsos preenchimentos: inchações. Tudo o que incha não pode ser salubre.
Chego à conclusão que ser pleno de algo, mesmo que aquele algo seja aparentemente bom, não significa encher-se daquilo até a “marquinha vermelha”; essa é uma plenitude que mata. E os extremos são inimigos da vida, disse certo sábio. Assim, já decidi comigo mesmo: não fugirei mais da dor, pois, como bem diz a música dos Titãs, “fugir da dor é fugir à própria cura”. Afinal, na prática, ser feliz não é estar pleno de felicidade, pelo menos não ao modo contemporâneo, negando toda e qualquer desventura. Ao mesmo tempo, não abandonarei o desejo de ser feliz. Mas quero ser feliz ao modo de Jesus, o homem de todas as dores e da total alegria, parafraseando Henri Nouwen.
Não se trata de morbidez ou masoquismo, mas de realismo esperançoso, querendo abolir quimeras e falsas esperanças. Não almejo que a dor e o sofrimento preencham todo o copo de minha existência – acaso desejaria a autodestruição? Muito menos tenho a pretensão de dar lugar apenas às ânsias por sucesso e felicidade, pelo menos não nessa perspectiva alienante e individualista do ser “bem-sucedido”. Jesus inverteu esses padrões quando estabeleceu no Sermão do Monte (Mt 5.1-12) a lista dos felizes ou bem-aventurados, conforme o Reino de Deus. Desejo engrossar essa lista.
Quero trilhar a via do meio, entre a plenitude e a tragédia. Nada em excesso; nenhuma coisa suplantando a outra. Será muito pedir para permanecer sendo apenas humano? E que a graça me desperte para o real; que a misericórdia me ajude a encontrar as alegrias escondidas em meio às tristezas – o riso no pranto; que a compaixão me conduza ao eu que há no outro e ao outro em mim. Quero apenas viver. Viver é gozar das plenitudes incompletas da vida.
Jonathan

sábado, 23 de fevereiro de 2008

Quem conhece a realidade?


Somente Aquele que disse “Eu sou a verdade” é que pode dizer que conhece toda a realidade.

Quem jamais conheceu a realidade? O que nós chamamos de realidade não existe a não ser nos nossos olhos. Porém, se pudesse ser vista por todos os ângulos e variáveis que envolvem a mesma coisa que chamamos de realidade, a nossa percepção de realidade sairia envergonhada pelo desvendamento de sua certeza-do-real como sendo mera e burra arrogância fantasiosa.

O melhor mandamento acerca da realidade é aquele que manda não julgar a ninguém. Assim, se afirma que a maior realidade possível ao homem, é a certeza que ele pode ter de não conhecer a realidade. Uma única mudança de humor transmuda e desfigura o mundo inteiro diante de nossos olhos, ou, paradoxalmente, o torna belo e desejável, apesar de tudo. Desse modo, não conhecendo quase nada acerca da realidade, e enxergando-a sempre a partir da parcialidade e da passionalidade de meu olhar, o que de melhor posso fazer por mim mesmo, em minha ignorância, é julgar cada vez menos, e buscar amar cada vez mais; pois, é somente por tal via que saber ou não saber perde a relevância diante da possibilidade de que os olhos sejam iluminados de dentro para fora; criando e iluminando a realidade que de mim se projeta.

Se não conheço a realidade, exceto uma ínfima parte dela, melhor do que buscar a luz que vem de fora como um saber supostamente pertinente ao que é real, ao contrário disto, devo me deixar acender, de dentro para fora, pela luz que produz um olhar que cria a realidade conforme a verdade, posto que a única realidade que me serve é aquela que é feita de verdade-fato-do-amor, que é o único elemento que dura para sempre, pois jamais acaba; sendo, portanto, de fato, real.

Assim, posso dizer que fora das produções do amor, toda realidade é apenas soma de olhares confusos e perdidos; pois, sem amor, até o que seria, não é; e mediante o amor, até o que não é, passa a ser. O único senso possível de realidade-verdade é aquele que é fruto do olhar que enxerga pela luz do amor. Sem o olhar do amor, até a maior realidade-fato-da-vida, não passa de fantasia; pois, apesar de existir, não é. Pense nisso!

Caio Fábio D'Araújo
http://www.caiofabio.com/

*Imagem: "Cristo de São João", de Salvador Dali.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

A história de um retorno pra casa

A parábola do filho pródigo é uma das sacadas mais inteligentes e profundas do Evangelho. Ela mostra que Jesus, apesar de não ter sido teólogo, filósofo ou poeta "de carteirinha", de fato possuía um gênio hiper criativo e uma capacidade de visão inesgotável, propiciando materiais que nem mesmo um teólogo ou filósofo poderiam esgotar. Esta é uma parábola que, guardadas as devidas proporções, retrata a história espiritual de cada um de nós. Espiritualidade é relacionamento. Assim, a parábola fala exclusivamente de relacionamentos, entre Deus e duas espécies de pecadores: o que se afasta da presença do Pai para “curtir a vida”; e o que se julga justo demais, digno demais, bom demais pra ser verdade. Fala também de temas como pecado, arrependimento, graça, alegria e filiação. Ao invés de parábola do “filho pródigo”, melhor seria dizer “dos filhos pródigos”, pois aqui são dois e não apenas um filho perdido.
A história do Filho Pródigo é a história de um Deus que me procura e não descansa até que me encontre”, disse Henri Nouwen, autor do livro A volta do Filho pródigo, publicado pela Editora Paulinas. A espiritualidade pode ser vista, nesse livro, como uma constante busca de reconciliação do Divino com o humano; como resultado de um retorno para casa, para os braços ternos do Pai. O Pai não é agressivo, nem opressor ou arbitrário, mas compassivo e solidário com a forma humana de ser, tendo paciência paterna de esperar pelo retorno do filho pra casa, uma espera semelhante a do horizonte pelo pôr-do-sol todas as tardes; seja o que for, aconteça o que acontecer, ele estará lá, no mesmo posto de sempre, esperando ansiosamente pelo retorno do amado.
"Deixar a casa é viver como se eu ainda não possuísse um lar e precisasse procurar muito à distância até encontra-lo. (...) Abandono o lar toda vez que deixo de crer na voz que me chama amado e sigo outras que oferecem múltiplos caminhos para que eu encontre o amor que tanto procuro. (...) Sou o filho pródigo toda vez que busco amor incondicional onde não pode ser encontrado. (...) Parece-me que essas mãos estiveram sempre estendidas – mesmo quando não havia ombros sobre os quais descansá-las. Deus nunca abaixou os braços, jamais retirou sua benção, nunca deixou de considerar seu filho como Amado. Mas o Pai não podia forçar o filho a permanecer em casa. Não podia impor seu amor ao seu amado. (...) Foi o próprio amor que o impediu de manter o filho em casa a qualquer preço. Foi ainda o amor que fez que deixasse o filho procurar o seu caminho, mesmo com o risco de perdê-lo. Aqui o mistério da minha vida é revelado. Sou amado a tal ponto que tenho liberdade para abandonar a casa" (Henri Nouwen).
A arte de Rembrant, e o livro de seu conterrâneo Nouwen - inspirado na pintura e na parábola - são boas dicas de reflexão para esse fim de semana. Afinal de contas, como vai dizer Gerson Borges no musical da Volta do filho pródigo, "todo mundo é pródigo"! (Ver: http://www.gersonborges.com/avolta.htm). E, aos pródigos de plantão, deixo meu abraço, carinho e um forte desejo de que, por mais que nos percamos, fujamos ou nos desencaminhemos por alguns momentos em nossas vidas, que sigamos as pegadas do amor de um Deus que, como pai, nos espera sempre de braços abertos.
Jonathan

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

É o Diabo um Teólogo?

Falar sobre teologia, para mim, sempre é um prazer. Aliás, assim deveria ser com todos nós, teólogos(as) “de plantão”, membros de igreja, líderes, pastores, profissionais cristãos, e assim por diante. Aprendi muito cedo com um amigo, também teólogo, que fazer teologia deve ser uma espécie de diversão, com alegria e paixão por aquilo que falamos. Afinal, estamos lidando com um suposto conhecimento sobre Deus, em sua revelação, e isso, além de maravilhoso, é um privilégio, certo? Do contrário, não valeria a pena, como nada na vida.
Nunca havia pensado no Diabo como um teólogo. A priori essa deveria ser sempre uma idéia inconcebível, pois, no final das contas, teólogos são aqueles sábios estudiosos que se esmeram em caminhar com Deus e em desvendar, por meio de linguagem humana, os mistérios revelados ou, quem sabe, ocultos da Palavra Divina. Como então poderia ser o Diabo, o Coisa-Ruim, o Cramulhão, o Chifrudo Vermelhão, o Inimigo, ou outras representações que dele se tenha, mas que nem sempre o “representam” realmente, um teólogo, na melhor acepção da palavra? Era, para mim, algo quase irrefletido, até que me deparei com as palavras de Eugene Peterson: “o Diabo pode ser definido como aquele tipo de teólogo que sabe tudo a respeito de Deus, mas que não quer nada com Ele”.
Constantemente, nós, teólogos, caímos na armadilha de almejar saber (cognitivamente) tanto sobre Deus, sem, no entanto, conhecê-lo na vida e sem nos interessarmos por aquilo que Ele É. Contudo, essa, definitivamente, não é uma prerrogativa apenas de teólogos, mas de todos aqueles que mergulham nesse mar infindo e processual de conhecer a Deus. Muitos, aliás, se perdem nesse artifício ao fazerem do próprio conhecimento um deus, supondo poder conhecer as minúcias tanto do Céu como do Inferno, devotando-se às capacidades da criatura ao invés de adorar ao Criador. Afinal, qual é a matéria-prima da teologia? Alguns diriam que é Deus, o que eu discordo. Deus não é substância nem produto da mente humana e por ela não pode ser apreendido; não é um objeto de estudos científicos, muito menos de cálculos matemáticos (essa foi e é a grande frustração da modernidade), posto que Ele não é sintético, mas é Espírito: Invisível, Indivisível, Imutável, Infinito. “Eis que Deus é Grande e não o podemos compreender; o número de seus anos não se pode calcular” (Jó 36.26).
Por isso, conforme opina Peterson, “o nome de Deus sem oração a Deus é a matéria-prima da blasfêmia. A verdade a respeito de Deus sem amor por Deus rapidamente degenera em opressão”. Oração, por outro lado, não é um mero rito ou experimento artificial, oração é vida, é o rumor do coração que se transforma em palavras, ou em simples silêncio, colocando nosso mundo limitado em vivo contato com o mundo ilimitado de Deus. Para mim, a principal matéria-prima da teologia é a vida, assim como orar é viver e como Deus é sinônimo de Vida e Liberdade plenas. Só se pode conhecer a Deus à medida que se celebra intensamente o viver, o viver junto com outros, imersos na realidade. A teologia que se vale da experiência de Jesus (O Deus Encarnado) está totalmente ancorada em, e em permanente relação com, a realidade que nos cerca, tantas vezes dura e cruel.
Dessarte, o fazer teológico (que não é aquele ao gosto do Diabo) não se reduz simplesmente a aprender de dois ou três teólogos sistemáticos, decorando algumas verborragias teológicas, participando anualmente de encontros literários para deleite intelectual, mas acontece na imersão do teólogo na realidade para enxergar as faces de Deus no cotidiano da vida comum dos “comuns”, e, por fim, produzindo palavras e ações que podem e devem ser relevantes à missão diária da igreja, não tomando, portanto, o triste destino da maioria, que é de se tornar arquivo (“morto”) dos departamentos e bibliotecas das faculdades teológicas.
Jonathan

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Muito mais que meras....

Lá vamos nós outra vez brincar com as palavras! É isso que a gente mais fez e faz no dia-a-dia da academia: puxar e esticar as palavras, de modo a adequar nossa linguagem e usá-la para estudar e expor a linguagem da Palavra Divina. A isso podemos chamar Teologia: essa habilidade de fazer festa com as palavras, porém desenvolvendo uma profunda reverência e temor à Palavra. Mas, pra mim, falar de teologia é falar de vida, então falemos um pouco da vida.
Cada um de nós tem histórias pra contar sobre nossas vivências, sejam elas engraçadas e alegres ou sejam tristes; para fazer rir ou fazer chorar, e quem sabe os dois ao mesmo tempo. Afinal, é disso que é feita a vida, de vales e montanhas (alguns discordarão), de muita cor ou de contrastes cinzentos. E quando todos estes momentos se misturam, então, que maravilha! Pronta está a matéria-prima da teologia, e é aí que a gente entra, nisso está a beleza da coisa, em não querer separar o que Deus, tantas vezes, uniu.
Não podemos simplesmente suprimir esses momentos, pois teologia não se faz apenas em sala de aula, nos gabinetes pastorais ou nas bibliotecas, mas acontece nas biografias de cada um, nos diversos lugares em que elas se constroem, na cozinha, no supermercado, no quarto escuro, nos parques de diversão, nas favelas, nos edifícios, nas aglomerações cotidianas, nas conversas particulares, nas brigas e desavenças, nos abraços apertados, nos sorrisos e nas lágrimas, nos cafés da manhã, nos becos da vida e, como não dizer, na igreja – que pode ser tudo isso, que é tudo isso. Não se teologiza a partir do passado; no instante do vivido é que a teologia começa, e então chegada é a hora de se entregar mais e mais nos seus caminhos, pois, onde quer que existam rastros das pegadas Divinas, nos lugares e situações mais inusitadas, formar-se-ão passagens para nós, teólogos e teólogas.
E a estes (as), uma última palavra de motivação e encorajamento: não se conformem jamais. Mantenham essa santa inquietação e rebeldia, que não nos permite desenvolver nossos ministérios numa acomodação quieta e morna. Se permitirmos, hoje, uma vez mais, sermos afetados por Deus, então seremos guiados na estrada de suas, sempre novas, loucuras! E que privilégio fazer parte da trama de um Deus tão Sábio, mas que se fez louco para não deixar-nos perdidos nas doidices desse mundo e para ensinar-nos a verdadeira sabedoria. Ele escolheu os loucos.
Portanto, sejamos loucos, sejamos sábios, pela Graça de Deus, como nas palavras do sábio-louco teólogo J. Urteaga: “A vida é um jogo em que sempre ganham os enamorados... não há nada de inútil na vida. As contrariedades, os obstáculos, esses conhecimentos que, pelo sentir geral dos homens, trariam consigo um sinal – na luta pela vida, podemos convertê-los em sinais (da cruz +), traçando fortemente a vertical do nosso desejo”.

Jonathan

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Tomei a palavra, Senhor!

A palavra, Senhor, é uma graça, nem tenho o direito de calar-me por orgulho, covardia, ignorância ou medo do esforço. Os outros têm direito à minha palavra, à minha alma,
E ninguém mais, senão eu Senhor, a poderia dizer.

Tenho uma frase a pronunciar, curta, cheia de minha vida. Esquivar-me não posso.
Mas as palavras que lanço têm de ser palavras verdadeiras.

Seria um abuso de confiança captar a atenção do outro, se debaixo da casca das palavras eu não comunicasse a verdade da alma.

As palavras que derramo têm de ser palavras vivas,
ricas daquilo que só minha alma aprendeu do mistério do homem.
As palavras que transmito têm de ser portadoras de Deus
pois os lábios que me deste, Senhor, são feitos para dizer minha alma

E minha alma te conhece e te guarda enleada.

Michel Quoist
de Poemas para Rezar (1981)

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

Fé ou fundamentalismo religioso II

No post de hoje, quero voltar ao tema da fé ou fundamentalismo religioso. Na verdade, trata-se de uma correspondência minha com uma leitora do blog, minha amiga Rosa, aluna de teologia no ISBL - Faculdade de Teologia, em Londrina, em resposta ao primeiro post sobre o tema.
Obrigado Rosa, pela participação.

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From: rosafalmeida@gmail.com
Date: Wed, 13 Feb 2008 22:18:25 -0200
To: joncalvin7@hotmail.com Subject: Agradecimento.

Oi Jonathan

Obrigada por ter enviado os teus escritos, fiquei muito feliz pois sou tua fã; gosto da maneira simples e sincera com que escreve.

Gostei muito do texto: Fé ou fundamentalismo religioso, também gostei dos outros mas esse tocou mais fundo minha alma, como já tivemos oportunidade de conversar, tenho um questionamento enorme sobre fanatismo religioso, surto psicopatológico e todos outros tipos de crueldade praticados em nome de seitas...

As vezes me surpreendo pensando que a religião faz mais mal do que bem a humanidade. Domingo passado fui ao cinema assistir o filme O caçador de pipas, e saí do cinema em prantos revoltada com o sistema religioso que aparece no filme.

Peço que quando fizer tuas orações, peça por mim, para que Deus me de sabedoria para separar o trigo do joio, pois normalmente eles estão entrelaçados em minha cabeça. E quando mais preciso ter fé, tenho somente duvidas duvidas e duvidas.

Um grande abraço.

Tua aluna.
Rosa
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Resposta:
Querida Rosa,
fico feliz que esteja gostando do blog, isso aumenta ainda mais minha pulsão em escrever e publicar coisas que têm povoado meus pensamentos ali. Concordo com você sobre o mal que a religião produz à humanidade. Também penso que se trata de um sistema escravizante, alienante e que mais serve à ideologia dominante do que libera as pessoas para Ser (usando aqui um pouco de Marx). Assim, não temos condições, especialmente quando lembramos das atrocidades já cometidas em nome de uma suposta "fé", inclusive dentro do próprio sistema cristão ou cristandade, para desautorizar os chamados "mestres da suspeita" (Nietzsche, Marx e Freud), em suas críticas ferrenhas à religião, nem tampouco às pessoas que, machucadas e feridas no caminho, se desencantam com o sistema e com todas as artimanhas perversas que ele produz em nome de Deus. Só que o "Deus" deles, já está sepultado, há muito tempo, como vaticinou Nietzsche, há mais de um século.
O que nos resta? Muito pouco ou nada, se nossas esperanças estão firmadas no sistema, na instituição, na humanidade caída. Mas se nossos olhares estão fitos no Cristo da graça, da misericórdia, solidariedade e encarnação na condição humana, existirá, assim, real esperança e redenção, não só para nossa vida no além-pós-morte, na glória, como em nossa vida presente. Apenas não será vã nossa fé, à medida que entendermos que ela não provém de um re-ligare artificial, mas é dom de Deus, algo que o Espírito promove em nossos corações, muitas vezes encharcados de dúvidas e incertezas.
O Espírito é livre e não se prende a esse sistema iníquo em que muitos infortunadamente colocam suas "fés". E se ele habita em mim e em você, como Jesus nos garantiu que seria, então temos a centelha pra revolucionar a igreja e o mundo, apesar do que somos, apesar das dúvidas. Oro para que o mesmo Espírito de Cristo, que nos consola nos momentos de tristeza e amargura, te dê sabedoria e discernimento para saber separar as verdades-mentira e as mentiras-verdade, que inadvertidamente grassam seja na igreja ou no mundo, do bom trigo de Deus, que é fruto da graça e de seu infinito amor.
Grande abraço,
Jonathan.


sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Filhotes da multidão

O filósofo existencialista Soren Kierkegaard, expressando sua inconformidade com o sistema, escreveu: “A multidão é mentirosa [...] mesmo se cada indivíduo, em sua privacidade, estivesse em poder da verdade, quando este se juntasse à multidão [...] a mentira surgiria”. Uma afirmação como essa pode parecer, num primeiro momento, paradoxal. Afinal, em uma cultura como a nossa, “de massa”, onde os valores (existenciais, institucionais, individuais ou coletivos) são mensurados quantitativamente, em que os números ditam as regras por terem um forte poder simulador de credibilidade, em que palavra crescimento (ou expansão) exerce um fascínio avassalador sobre as pessoas, apesar de quase nunca co-existir com a integridade, enfim; dizer algo desse tipo é ferir uma espécie de quase-unanimidade.

Nelson Rodrigues disse certa feita que se todos concordarem com você nisto ou naquilo, pode saber que alguma coisa está errada. Seria por demais arriscado “con-formar-se” com sua famosa máxima de que “toda unanimidade é burra”? Por outro lado, quem se arriscaria em defender, por exemplo, que todos os políticos eleitos pelo voto popular (seja unanimemente, seja maioritariamente), sempre exercem seus mandatos com decoro e ética ao invés de corrupção? Ou então, quem poderia sinceramente dizer que todo produto o qual adquire a insígnia de “best-seller” (mais vendido), também é sinônimo de qualidade?

Conta-se em um mito popular, que certa vez foi dito aos romanos que se não fosse possível construir uma bela casa, que se construísse uma casa bem grande. Para Eugene Peterson, tal lógica ainda faz sentido em nosso dias, isto é: “se não posso fazer bem, então devo fazer grande”. Mas diante de um crescimento espantoso alguém poderia talvez justificar: “alcançamos a quantidade com qualidade”. Ora, mas qual seria o idiota que se prestaria em afirmar o contrário?
Portanto, nós, seres do hoje-em-dia, somos filhotes da multidão, isto é, indivíduos forjados e protegidos pela multidão, sujeitos às “frivolidades” e “desumanidades” propagadas pela multidão. E aqueles que, porventura, ousam se negar a compactuar com os gostos e hábitos da multidão são como “estranhos no ninho”, “patinhos feios” destoando da “grandeza” do que é comum. Nas multidões de nossa cultura ocidental, dita pós-moderna, encontramos cada vez mais cifras, números, códigos, edificações, etc., e cada vez menos pessoas.

Jonathan

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

Diálogo com um decepcionado

Friedrich Wilhelm Nietzsche (na foto) foi um filósofo e filólogo alemão, nascido em 15 de Outubro de 1844 em Röcken, uma localidade próxima de Leipzig. Hoje, mais de cem anos após sua morte, Nietzsche é conhecido dentro e fora dos ambientes acadêmicos como um cético inveterado e ateu, severo crítico do cristianismo, que declarou a “morte de Deus”. Não tem como querer perscrutar as razões que levaram Nietzsche a tomar tais posições sem querer dar uma de analista extemporâneo ou psicólogo com paciente “no além”. Não tem como analisar psicologicamente um morto.
E mesmo que fosse corpo presente, só Deus pode abrir os corações e julgar os segredos humanos. Logo, o que temos são pistas, rastros, pegadas, indícios, a partir do que ele escreveu. Nesse sentido, a qual Deus Nietzsche refere como “morto”? Que tipos de representações de Deus lhe foram projetadas pelos cristãos de sua época?
A tese que defendo é a de que Nietzsche decepcionou-se mais com a igreja que com Deus, ou decepcionou-se com Deus, mormente, por causa da religião cristã, isto é, em função da forma como essa lhe apresentou a divindade. Alguns queridos irmãos nem sequer parariam um instante para ouvir o que ele teve a dizer, posto que já condenaram esse filósofo na fogueira de suas inquisições. Para muitos, Nietzsche morreu louco e às suas palavras não se pode dar crédito algum. A insanidade de Nietzsche foi real, como foram precoces alguns dos juízos “teológicos” que ele fez acerca de Cristo, de Paulo e da Palavra. A meu ver, em parte de sua obra, ele apresenta os argumentos equivocados, mas pelas razões certas. Basta lê-lo pra saber. Só que isso é o que menos fazem os cristãos, pois como foi dito, ele já está condenado, e ler Nietzsche também é visto como um ato herético por alguns. Todavia, nem a infantilidade e imprecisão de algumas concepções teológicas desse autor, muito menos sua suposta “loucura” nos outorga o direito de desprezar o que ele disse.
Afinal de contas, louco ou não, ele escreveu coisas muito sábias acerca das bestagens dos cristãos de seu tempo. Loucura, sabedoria; o que são, de fato, essas categorias? O que impede um Deus, que é visto como louco pelos “sábios” desse mundo, de amar e aceitar um filho perturbado, desorientado, mas que viveu à procura do caminho de retorno à casa do Pai, embora, acredito, ele mesmo nunca teria admitido isso em público? Podem até dizer que eu não entendi Nietzsche – aliás, essa é a frase mais repetida por seus “estudiosos”. Mas o fato é que Nietzsche não parece ter tido a pretensão de ser entendido. Ele era o paradoxo em pessoa, e, paradoxalmente, talvez essa tenha sido uma de suas principais virtudes.
Quem quiser ler na íntegra o artigo que escrevi sobre Nietzsche, acesse na página da Fraternidade Teológica Latino Americana (FTL):
http://www.ftl.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=91&Itemid=4.
Jonathan

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Por que o mundo não muda?

A mudança é uma qualidade (ou defeito, depende de sua natureza) inerente ao ser humano; é um ato de substituir ou transformar. Diz-se que o ser e o mundo estão em constante mudança – não se sabe se pra melhor ou pior. Às vezes isso soa até como um processo invisível, que passa despercebido a olhos nus, estáticos, como uma espécie de evolução natural. Mas a impressão que fica é que esse tipo de concepção da mudança, de um modo genérico, sempre é incompleto, que não é assim que deve funcionar.
Mudança, então, é um acontecimento: histórico, factível, concreto. Esperamos que as coisas mudem – especialmente aquelas que nos afetam diretamente – quando são cabíveis, já que o anseio por mudanças é precedido por certa necessidade. “Vivemos esperando, dias melhores”, diz a canção da banda Jota Quest, “dias de paz, dias a mais, dias que não deixaremos para trás”. Vivemos esperando... e isso é parte do problema. Será essa uma chave para responder à tão inquietante aporia (por que o mundo não muda)? Esperança e paciência são dons raros hoje em dia, num mundo de efemeridades e urgências. Mas esperança sem ação não transforma nada (nem pode ser esperança); pelo contrário, converte-se em medo, resignação, alienação e cinismo. Percebemos, desta feita, que a mudança, em certa medida, é algo radical, custoso, paradoxal. Espera-se tanto, mas se luta tão pouco por aquilo que se espera.
Esperança é espera, mas também é luta, protesto, movimento. Quando, porém, nos damos conta da realidade complexa a nossa volta, percebemos sua crueza e crueldade. Preferimos ignorá-la, em nome da segurança e do conforto. Eliminamos a esperança, frustramos a mudança. Por que o mundo não muda? Porque passamos muito tempo, ocupados em nossas agendas particulares, e a esperar, esperar que tudo mude, através de outros, ou do nada, uma hora, de algum jeito, quem sabe. Pedimos aos céus, e parece não haver resposta; estamos surdos demais para ouvir o que “ele” tem a dizer, ou para ver seus “sinais”. Só se dá importância ao céu quando a vida na terra transpassa os limites de ser uma alternativa plausível e suportável, não é mesmo?
O mundo não muda porque não mudamos. Não enxergamos que “mundo” não é só o planeta terra, mas as pessoas e os sistemas engendrados por elas. Precisamos, nesse aspecto, aprender a conjugar o mundo como um verbo (“somos”), e assumi-lo como dimensão formativa de ser-no-mundo. O escritor inglês G. K. Chesterton parece, em tese, ter entendido isso. Quando ele e outros importantes escritores de seu país foram convidados por uma revista a escrever artigos opinando sobre a questão: “O que há de errado com o mundo?”, sua carta foi a mais curta, honesta e contundente de todas. Ele escreveu apenas isso: “Senhoras e Senhores, Eu. G. K. Chesterton”. O mundo não muda, e pra melhor, em muitos aspectos; poderia elencar aqui vários. Basta parar e olhar um pouco ao redor. E se ele não muda, em algum sentido, é porque o mundo também sou eu.

Jonathan

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Uma vida agradecida

Olá meus caros bloggers de plantão! Para que não venha enfadá-los apenas com minhas reflexões e pensamentos, hoje quero subscrever um texto de um dos mais fabulosos, inteligentes e sensíveis escritores cristãos que já li e sobre quem já ouvi falar: Henri J. M. Nouwen (na foto).

Farei isso não apenas hoje, mas, já que esse blog é voltado para a leitura e a escrita, quero fazê-lo não apenas com Nouwen, que é um de meus autores prediletos, mas também com outros escritores que admiro. Segue abaixo uma reflexão desse autor sobre a gratidão.


See ya! Jon.


Como poderemos viver realmente uma vida em ação de graças?

Quando olhamos para trás e vemos tudo o que nos aconteceu, facilmente dividimos a nossa vida em várias fases, com coisas boas para agradecer e coisas más para esquecer. Mas, com um passado assim dividido, não podemos caminhar livremente em direção ao futuro. Com tantas coisas para esquecer, o máximo que podemos fazer é coxear rumo ao futuro.

A gratidão espiritual abarca todo o nosso passado, tanto os bons como os maus eventos, tanto os momentos alegres como os tristes. Do lugar em que nos encontramos, podemos concluir que tudo o que nos aconteceu nos trouxe a este lugar. Recordemos tudo isso como parte do plano de Deus que nos conduz. Isso não quer dizer que tudo o que nos aconteceu no passado seja bom, mas quer dizer que mesmo o mal não aconteceu fora da presença amorosa de Deus.
Os sofrimentos do próprio Jesus foram-lhe causados pelas forças das trevas. Mesmo assim, ele fala dos seus sofrimentos e morte como o caminho da glória. É muito difícil colocar todo o nosso passado sob a luz da gratidão. Há muitas coisas de que nos sentimos culpados e envergonhados, muitas coisas que desejaríamos que pura e simplesmente não tivessem acontecido. Mas, cada vez que temos a coragem de olhar para elas “na sua totalidade” e de as ver como Deus as vê, nossa culpa torna-se uma culpa feliz e a nossa vergonha uma vergonha feliz, porque provocam em nós um reconhecimento mais profundo da misericórdia de Deus, uma convicção mais forte de que é Deus quem nos conduz e um empenho mais radical na aceitação da vida ao serviço de Deus.

Desde que todo o nosso passado seja recordado com gratidão, adquirimos a liberdade para ser enviados para o mundo a proclamar a Boa Nova aos outros. Assim como as negações de Pedro não o paralisaram, mas, uma vez perdoado, se tornaram uma nova fonte de fidelidade, assim também as nossas falhas e traições podem transformar-se em gratidão e capacitar-nos a ser mensageiros de esperança.

Henri J. M. Nouwen
Texto extraído do livro Mosaicos do Presente (Paulinas, 2003)

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Fé ou fundamentalismo religioso?


Nos ultimos tempos, temos visto e ouvido constantemente exemplos de fundamentalismo religioso, que se aplicam a diferentes tipos de crença, desde islâmicos e hindus, até católicos e protestantes. Bin Laden, George Bush, Bento XVI... figuras públicas, homens de "fé"? Quais os limites ou limiares que estabelecem clivagem entre a fé genuína e o fanatismo religioso?

Fanático é todo aquele que se devota exageradamente a alguém ou a alguma coisa. O fanático, via de regra, é visto como um desvairado que cegamente se atira precipício abaixo, se preciso for, em nome de suas “convicções de fé”. Mas esse tipo de crença nada tem a ver com as convicções bíblicas de fé, porque milita contra a vida. Basta olharmos para a fé de Jesus e o que era “fé” para ele. Quer exemplo melhor? Jesus nunca deu uma “definição” sequer de fé, como vemos em Hebreus, mas usou exemplos de pessoas que se destacaram por causa de sua fé Nele, do meio de gente muito ávida para ver seus milagres, mas totalmente destituída de fé. Um exemplo positivo foi o caso dos quatro homens de Cafarnaum que carregaram um paralítico até Jesus (Mc 2.1-12). Demonstraram uma fé, ao mesmo tempo, solidária, corajosa e inteligente. Não se trata de doidice ou devaneio. A fé bíblica pode ser vista como um passo de coragem que damos pelo poder da Graça de Deus.

Ter fé é viver em solidariedade com os outros e partilhar a esperança da libertação em Jesus. Fé é a convicção de que é preciso assumir riscos (sem colocar em risco a vida alheia) reconhecendo que a vida nos guarda surpresas inesperadas, mas que Deus, invariavelmente, também nos surpreende com seu irredutível amor. Não há limites para essa fé, porque é dom. Devemos delimitar, sim, e diferenciar aquilo que muitos chamam “fé”, e que não passa de surto psicopatológico, de pessoas regradamente presas a um dogma e desregradamente soltas para dizer e fazer tudo que for preciso para defender aquela “verdade”, da fé genuína, surpreendente e libertadora de Jesus. Essa última é fé; já a primeira é fanatismo, fruto dos fundamentalismos religiosos de nosso tempo. Dessa “fé” eu quero distância.

Jonathan

sábado, 9 de fevereiro de 2008

Oração: silêncio e revolução

É comum ouvirmos sobre oração como um meio apenas de alcançar as bênçãos espirituais e materiais, que Deus de alguma forma reteve à espera de que as requisitássemos. Mas será que oração é um mero exercício espiritual individualista? Apenas um discurso em que despejo um “caminhão” de petições e problemas a Deus esperando que ele resolva? Ou será que o ato de orar pode produzir algo na vida da igreja além de benefícios pessoais e remediações circunstanciais?
Oração é um exercício de consciência em relação ao que sabemos sobre Deus por meio de sua Palavra (que veio primeiro), e ela nos ensina que Deus conhece nossos medos, anseios, petições, desejos, tristezas, alegrias e sonhos antes mesmo que lho submetamos (ver Mt. 6:5-8). Assim, devemos evitar os mecanismos monótonos, repetitivos e hipócritas que transformam a prática da oração um fardo para nós e um enfado para Deus. A oração deve ser uma viva, íntima e incessante conexão entre nós e Deus, entre nosso mundo de complexidades passageiras e conflituosas e o mundo eterno e invisível de Deus, nos fazendo experimentar da eternidade e a aprender a cultivar valores permanentes, os valores do Reino.
Duas palavras, apontadas por Henri Nouwen, podem gerar um campo fértil para uma vida de oração equilibrada e frutífera: Silêncio e Revolução. O silêncio pode ser mais revolucionário do que possamos imaginar e a revolução mais silenciosa do que consigamos conceber. A ação transformadora do evangelho envolve essas duas coisas, posto que os efeitos do sal e da luz produzem muito mais do que barulho, sinais, imagem ou espetáculo. Produzem vida. Por isso, orar pode ser simplesmente ficar em silencio e deixar o coração chorar em meio ao golpe da hora difícil, permitindo que o interior fale de suas mazelas e que Deus tome conta da situação. Oração é também revolução, pois o orante acredita e espera por um futuro que não vê, incendeia seu redor com uma inconformidade santa e luta pela vida, pela liberdade humana, pelo Reino de Deus.
O relato de Atos, fala sobre a oração dos primeiros cristãos: “Depois de orarem, tremeu o lugar em que estavam reunidos; todos ficaram cheios do Espírito Santo e anunciavam corajosamente a palavra de Deus” (At. 4:31). Quando a oração deixa de ser uma simples passividade piedosa, levando à comunhão e essa à ação compassiva da igreja, o Senhor mesmo acrescenta os novos discípulos, fortalece os que já são e prepara a igreja para ser um povo não só “crescido”, mas também maduro. Quando a oração deixa a monotonia para se tornar algo dinâmico e natural, começamos a suspeitar, como ressalta Henri Nouwen, que “orar é viver”, viver a vida de Cristo.

Jonathan

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

As dores indolores do mundo


Estou cansado das “dores” indolores deste mundo
Cansado de me cansar e de nunca des-cansar
Cansado do descaso dos opressores e da apatia dos oprimidos
Dos que “ouvem” sem ouvir, e “escutam” sem escutar,
os gemidos que ecoam da “alma” enferma das pessoas,
dos cauterizados pela falta de esperança,
e desumanizados pela banalização da vida humana

Cansado da mente velha, velha-mente
Que cultiva o não-valor, a vacância de sentido
da relatividade ao relativismo, da coletividade ao coletivismo,
da cultura “global”, que de global nada tem,
cerne de um sistema não apto-adepto da renovação,
mas da “lavagem da mente”, do inconsciente-consciente-inconseqüente

Cansado do conformismo e da inépcia dos que se arrogam cristãos,
De suas “políticas” despolitizadas,
De suas “renovações” não renovadas
De seus dogmas superficiais e deslumbrados
Capazes de “coar um mosquito”
E simultaneamente “engolir um camelo”

Cansado, mas, mesmo assim,
prossigo na vida que se segue,
Seguindo a Cristo, que me dá a esperança do “descanso eterno”,
Em um “novo céu” e uma “nova terra”,
“onde não haverá mais morte, nem lamento,
nem choro, nem dor, pois, nela, a antiga ordem já passou”,
E àqueles que, como eu, fazem parte da trupe dos inconformados e sobrecarregados com a atual ordem das coisas,
Jesus continua a dizer: “vinde a MIM...e EU vos aliviarei”.

Jonathan




Novo ano, vida nova?

É muito comum nas passagens de ano vermos as pessoas fazendo votos, promessas e desejos para o ano que vem. E nesse não foi diferente. Feliz 2008? Nada de novo debaixo do céu. Sempre ouvimos os mesmos votos de felicidade, saúde, paz, alegria, prosperidade, sorte no amor, na vida, nos negócios... O “blá, blá, blá” de antigamente é o mesmo de hoje, com algumas nuances. Felicidade, antigamente, era uma palavra mais ligada a coisas singelas da vida, como casar, ter um filho, receber flores. Hoje tem se tornado objeto de comércio e marketing, por parte dos veículos de comunicação, empresas e até igrejas. “Mas que mal há nisso?”, talvez algum(a) leitor(a) pergunte intrigado(a).

Está certo, mal pode até não fazer – que mal pode haver em se desejar coisas boas, um recomeço, uma vida nova, um ano novo? Porém, em que medida realiza o bem? Esse “bem” não é apenas o fazer-se-sentir-bem dos psicologismos auto-estimulantes e das “piedades pervertidas” (Ricardo Quadros Gouvêa) de nosso tempo, mas um “bem” conforme os padrões Divinos, que nem sempre (ou quase nunca) coadunam com as expectativas irrealísticas reverberadas por cada um de nós, ano após ano. A esse respeito, a palavra de Deus ao profeta Jeremias me chama atenção: “Eu é que sei os pensamentos que tenho a vosso respeito; pensamentos de bem e não de mal, para vos dar o fim que desejais” (Jr 29.11).

O “fim” aludido no texto é bem específico, e não genérico – pois diz respeito ao anseio mais premente do povo naquele instante: a libertação do cativeiro na Babilônia. Logo, não é um texto a ser aplicado deliberadamente (e há algum que pode ser?). A lógica da banalização, se pudesse prever, pode ser resumida no seguinte: ora, se os pensamentos de Deus são de bem, para dar o fim que eu desejo, então Deus (que é o “Deus dos impossíveis”), está disposto a mover céus e terra para me beneficiar – como fazer parar uma chuva, apenas para que eu possa ir de um lugar a outro sem me molhar, por exemplo. Essa lógica é furada. Primeiro, porque transgride o sentido bíblico. Segundo, porque promove uma transferência de vontades: de mim para Deus e de Deus para mim, como se entre ambas houvesse uma perfeita harmonia e como se o que pensássemos ser “muito bom”, em qualquer situação, de fato realizasse o bem de Deus em nós.
Desse modo, invertemos os paradigmas, subvertemos as “vontades” e simplesmente absorvemos as prioridades que estão na agenda da humanidade ano após ano, como se elas representassem a todos num todo, como se convergissem com as dinâmicas da realidade e ainda conseguissem manipular a Deus, que simplesmente assina embaixo e abençoa a todos, fazendo o papel do “bom velhinho”. Honestamente, chamem-me de cético, chato, pessimista ou do que quiserem, mas isso tudo não passa de ritual vazio e quimérico papagaiado por todo mundo todos os fins de ano sem a devida reflexão e percepção da realidade ao redor. Falta-nos sensibilidade e criticidade e muito mais.
Vida nova? Bem, a vida segue, e ela não se renova apenas com votos e nem com a passagem de ano – que pode ser vista como simples mudança no calendário – porém, se renova à medida que a mente e o espírito se renovam. E como se renovam? Se, e somente se, compreendemos que “viver em novidade de vida” conforme o Evangelho é uma proposta muito mais abrangente e não cabe na agenda triunfalista dos fins de ano e nem pode ser comercializada. Paulo, o apóstolo, diz: “Assim também andemos nós em novidade de vida”. O primeiro passo para isso já foi dado por Cristo na cruz, sepultando consigo nosso estado de condenação e culpa pela escravidão do pecado; o segundo quem dá somos nós, na energia e força do Espírito, quando sepultamos aquele velho ser imerso em pecado e ressuscitamos para uma nova vida em Cristo. Vida que se revigora na renovação diária de nosso compromisso com Ele, na dependência de seu Espírito.
Nossos planos, votos, felicitações triunfais de nada servem se estiverem fora desse propósito. Nada de “novo”, se essa novidade não partir de dentro pra fora, na metanóia diária que deve se impor como confrontação aos paradigmas desse século: “E não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus” (Rm 12.2). Em outras palavras, não se trata de uma vontade que se revela magicamente, mas pela vivência e ação: renova-ação, inconforma-ação e obediência aos valores revelados no Evangelho. E nisso não tem nada de “Abracadabra”.
Novo ano, vida nova? Nem sempre. Nada pode ser feito novo se não for entregue em “mãos maiores”, aquelas que possuem a primeira e a última palavra: “Haja luz” e “Eis que faço novas todas as coisas”. Portanto, para esse ano que já nasceu, prefiro fazer um voto-oração mais bíblico e realista: que a graça nos conduza para uma vida nova em Deus, conforme Deus e para Deus!

Jonathan

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Sofrimento e esperança!

Inicio esse blog com uma homenagem ao meu amigo Marcos Colares Ribeiro, que perdeu sua querida mãe na última sexta-feira, dia 01/02/2008, e agora sofre o luto pela partida daquela que tanto se dedicou a ele por toda a sua vida. A você meu amigo, dedico essa breve reflexão, na esperança de que a paz de Deus, que excede todo entendimento, console seu coração nessa hora difícil. Grande abraço!

SOFRIMENTO

Que postura devemos adotar diante do sofrimento e das perdas? O que fazer quando a vida nos golpeia com tempos difíceis, quando as palavras desaparecem ou perdem sua validade tornando-se tão vazias e áridas quanto o deserto de nossas vidas? E quando nossos belos e “indiscutíveis” conceitos produtores de sentido caem por terra, assim como tudo aquilo que não é eterno e que, até então, nos servia de sustentação, se esvai? Que fazer quando todas as horas são dores, e todas as dores lágrimas, vertidas em sangria de uma alma ferida e prostrada?
O fato paradoxal é que nada pode ser feito e tudo pode ser feito. Nada podemos fazer à medida que o sofrimento nos entorpece, fazendo-nos sentir incapazes de impor ordem e vontade própria às nossas vidas. Pode nos fazer pessoas melhores, se assim permitirmos, como também pode nos tornar pessoas ainda mais complicadas, caso o enfrentemos com a energia da amargura. Dor é sempre dor, e não há nenhuma pessoa que esteja isenta dela. O diferencial, porém, está em como a tratamos, a quem submetemos, com quem e se compartilhamos, ou até mesmo que lições extraímos.
A impotência nestas horas é, de certo modo, um fator positivo, posto que faz relembrar o fato de que somos humanos, e que não temos resposta nem jeito pra todas as coisas. Ora, se com a prepotência, o orgulho e o desejo de controlar tudo ao nosso redor, caminhamos rumo a desumanização, diante da morte e do sofrimento nossa humanidade começa a ser resgatada. Neste sentido é que “tudo” também pode ser feito. Afinal, podemos ou não afirmar que o poder e a graça maravilhosa de Deus transcendem as limitações da presente existência e até mesmo da morte? Sim. Mas nem todas as coisas abaixo do sol possuem uma explicação racional ou conseqüente, poder-se-á indagar. Uma perda irreparável, uma morte trágica e cruel: como esclarecer tais acontecimentos humanamente inevitáveis?
O fato de não entendermos o que Deus fez e faz não significa que ele não tenha um propósito para todas as coisas. E as razões para muitos de seus propósitos, só compreenderemos na eternidade. Tudo isto, como diz Eugene Peterson, “não nos diminui, nem destrói, mas nos torna plenamente humanos”; nos transforma, se assim permitirmos, em seres que se entregam plenamente às garras da graça de Deus, na firme esperança de que um dia florescerá a semente da ressurreição de Cristo, nosso consolo por excelência e o sinal da nossa ressurreição. Cristo sofreu e ainda sofre conosco as muitas dores inerentes ao existir. Porém, ele ressuscitou e, como se não bastasse ter vencido a morte, fez brotar a vida e a esperança que hoje nos movem através do sofrimento. Por isso, anime-se e não se curve, pois não é vã a nossa fé!